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Mães: ancestralidade e descendência. Homenagem da Cultura Nordestina

Homenagem à Mãe Terra, por Salete Rêgo Barros

Época, cultura e representações simbólicas até podem variar entre gerações, porém, na essência, seremos sempre as mesmas fiandeiras e tecelãs com nossas histórias e sonhos; palavras e canções. O fio que nos une desde sempre – Donatila, Theodolinda, Ivanete, Salete, Érica, Laís e Mariana – é o da intuição, criatividade, amorosidade, determinação e poder de cura, que pode vir a se perder momentaneamente nas dobras do tempo, mas, jamais, deixará de voltar à superfície após um mergulho profundo.

Este é o exemplo que a Natureza traz a cada novo amanhecer: o de se nutrir com a própria seiva, renascer e gerar novos frutos, aos quais será confiado um inestimável legado.

Este segundo domingo de maio de 2020, marcado pelo isolamento necessário ao combate à pandemia provocada pelo distanciamento de nossa Grande Mãe, em nome do progresso da humanidade, é uma excelente oportunidade para fazermos o mea culpa com lucidez e sabedoria. Em que momento foi perdida a ponta do laço do equilíbrio entre desejos e necessidades?

Agora, o que mais importa é retomar este fio e trazê-lo de volta, para que possamos manter a comunhão permanente com a essência da vida e entrarmos, triunfantes, numa nova era.

 

Mães: ancestralidade e descendência, por Suzana Cavalcanti

Toda a minha trajetória de vida foi marcada pela presença divina de três mulheres: Elzania Lopes Ramos – minha mãe biológica, Josefa Severina Cavalcanti – minha mãe de criação e avó paterna, e Astrogilda Ramos – minha avó materna.
Em todas eu reconheci os arquétipos da mãe, da feiticeira e da bruxa.

No arquétipo da mãe temos a representação da mulher em sua plenitude, como fonte de amor e também de sensualidade. A mãe é a força que impulsiona a criação, a fecundidade, o amor por todos os seres e a compaixão. É o útero que gera, a terra que alimenta, a fonte doadora de amor e cuidado.

O amor de mãe nutre, hidrata, aquece e ampara a todos. Seu amor cura todas as aflições. A mãe é Maria, Gaia, Oxum, Iemanjá, Deméter, Pachama, Lakashmi, Isis e todas as deusas mães.

Essas imagens contêm todas as qualidades do que uma boa mãe tem. A energia da mãe é solar e se associa à energia do Verão, onde há abundância de Sol e alimento e, da Lua Cheia, onde há plenitude e luminosidade. Este arquétipo na minha vida foi representado pela minha avó paterna.

Esta mesma figura fez o papel da feiticeira, que representa a sombra ou o aspecto furioso do feminino, a Mãe Escura ou Mãe Terrível. Em várias culturas a imagem da feiticeira é aparentada como uma mulher má, indomável ou furiosa. A feiticeira é a sombra de todos os arquétipos. Ela é a alquimista, aquela que mergulha nas profundezas e transforma aquilo que não é mais desejável e algo precioso.

A feiticeira é também aquela que conhece a sua sexualidade e pode utilizar essa energia para fins mágicos. Ela caminha pelos mundos do inconsciente, do misticismo e da intuição.

Ela também é a mulher madura que já não menstrua mais. Alguns povos acreditam que ao deixarem de menstruar, as mulheres guardam energias alquímicas e cíclicas da Lua para dentro de si, tornando-se assim sábias. As deusas relacionados a esse arquétipo são Kali, Yaga, Cerridwen, Morgana, Oba e Yansan.

No arquétipo da bruxa – a sábia que vive nos bosques, focada para dentro de si mesmo – tenho a honra de CONVIVER com a minha mãe. Sem marido ela não presta, precisa mais dos outros, da sociedade, e tem de adaptar-se a ela.
A “bruxa” pode ser quem ela é e assim se basta. Sua companhia são os bosques e os animais.

Como uma velha anciã com o corpo já debilitado pelo tempo, ela tem pouca energia para movimentar-se ou realizar coisas no mundo exterior. No entanto, dentro de sua mente tece sonhos e histórias. Toda a sua força de criação, conexão e cura, está potencializada pela sabedoria e por sua conexão com o mundo visível e invisível. A bruxa é Hestia, Nana, Hecate e todas as deusas que contêm essa energia.

Salve Elzania Lopes Ramos!!!
Salve Josefa Severina Cavalcanti!!!
Salve Astrogilda Lopes Ramos!!!
Salvem as Mães do Planeta!!!

Por Sineide Gemir

Admirava muito minha mãe; sua maneira de enfrentar as dificuldades, sua fortaleza, sua sapiência. Mesmo nos momentos difíceis, tinha uma fé inabalável e apesar dos pesares, gostava muito de viver. Uma mulher incentivadora, uma promovedora da paz. Teve seis filhas, criou cinco, pois Deus levou a segunda ainda bebê. Minha mãe dizia que a maior herança que ela nos deixava eram os nossos estudos. Eu não fui mãe biológica, porque não foi possível chegar ao final da gestação. Participei da criação e educação dos meus sobrinhos, entre os quais um menino muito bonito e inteligente, de bom coração, com distúrbios de comprimento; a ele dediquei minha vida, me sacrifiquei, sofri muito, até o dia em que ele voltou para a morada do Pai Eterno, aos 27 anos.

MÃE, por Ivanilde Morais de Gusmão

Há tempos queria te escrever,
somente agora percebi que o momento
havia chegado. Sento-me em frente à
tela do computador e junto a mim
uma foto tua esmaecida pelo tempo.
O olhar é longo e distante como que
atravessando o universo.
Diferentemente de ti, que partiste jovem,
muito jovem, o meu caminho foi longo.
E agora, diante dos acontecimentos
tive necessidade de escrever-te.

Olho a janela e sinto que me é indiferente
se o mundo continua ou não a existir.
A vida perdeu o significado, a importância;
por isso antes do silêncio da memória preciso
dizer-te que tomei essa decisão,
cheguei à conclusão de que a vida decorria
agora em função das aparências
e que já não mais me interessavam.

Preciso explicar, Mãe, a decisão está ligada
ao fato de que, além da idade, me cansam as coisas
nesse tempo partido de muita desalmação.
Num mundo ameaçado por algo desconhecido,
e, termos que enfrentar a sentença de
extermínio, porque somos peças descartáveis…
mais sensato é decidir livremente o instante
de apagar as luzes desse entardecer…

Assim, antes que minha vida/morte seja
decidida por outros, defino eu o momento!

Em paz vou ao teu encontro.

Apenas uma coisa me perturba, e não sei
com lidar: partistes cedo, jovem, então,
quando nos encontrarmos terei
a imagem de mãe e tu de filha.
Como será que lidaremos com isso?

Não importa! O que importa mesmo
é estarmos juntas. Te falarei das coisas,
dos livros que li e escrevi…
É chegado o momento. Espera-me!
Amanhã, nos primeiros raios de sol, partirei.

Ah, Mãe, estaremos juntas infinitamente…

Anastácia (Dona Dina)

Ivanilde, Andréa e Katarina

Dias de colo e carrasco, por Taciana Valença

Lembro bem da sua firmeza em minha vida, tal qual capitão do mar, como bem dizia meu pai: o negócio dela é dar as ordens! Mas ao mesmo tempo ria porque sabia que certas ordens e firmeza eram necessárias no comando da educação de quatro filhos e no comando do lar, já que ele trabalhava o dia inteiro.
Pelos filhos largou sua profissão de dentista, por eles foram todos os seus dias. E sim, ela era chata, um carrasco quando íamos ao supermercado e negava bombons e chicletes por causa dos dentes. Carrasco quando não me deixou ir na primeira viagem com a equipe de natação do Clube Náutico aos doze anos de idade. Carrasco quando vinha atrás da gente o dia todo repetindo algo que já sabíamos, mas garantindo que jamais esqueceríamos. Carrasco quando ficou sem falar comigo porque terminei um namoro com um rapaz que ela gostava. E carrasco sim, quando suas ideias não se afinam com as minhas e vejo que nossas compreensões são hoje, em alguns pontos, tão diferentes. Culpa sua, pois me deu a chance de estudar em bons colégios, estimulou leituras e esportes e me deu a possibilidade de ser uma mente pensante e questionadora.
E de colo se fizeram todas as outras coisas. Seus dias de motorista (colégio, natação, ballet, inglês, vôlei, hóquei, judô, etc.), organização das festinhas em casa, idas e vindas das festas com o carro cheio de amigas, nas feiras de ciências, ajudando a levar todo o material necessário aos trabalhos, nas frases firmes quando das nossas decepções (sem dar muita corda aos nossos choros). E é a esse colo que devo a força que tenho hoje, a crença de que podemos superar tudo, até nos momentos mais difíceis, como o que passamos agora.
Ligo para ela e ouço que tudo vai passar, que faz parte, que o mundo precisava disso. Então me aquieto, nas incertezas felizes de que tudo tem um propósito, mas com pés firmes no chão. Penso que sim, tudo tem um propósito e, para não desabituar ao hábito de pensar, aproveito o tempo para saber se cumpri minha função aqui na Terra. A resposta ainda é não, a sensação é de que ainda não cumpri. Aí me lembro de, num acidente de carro, ter sido jogada pela janela e terem me achado debaixo de outro carro. Sim, poderia ter morrido aos três anos de idade, mas havia um propósito para ter ficado aqui. É esse que busco hoje.
Culpa dela? Sim. Continuo procurando ir além do óbvio, além do que vejo, além do que dizem, além do que gritam aos quatro cantos. E também culpa dela de pensar diferentemente dela em muitas coisas.
Definitivamente culpada por ter me ensinado a pensar, ensinado a não esmorecer, ensinado a cuidar dos meus filhos, ensinado que a vida é passageira e que há algo além desse mundo que limitamos pela nossa própria incapacidade de entender.
Culpada por passar por cima das suas dores para amenizar as nossas.
Sentença: Stella Doris Lemos Valença
Culpada e amada
Crime: colo e carrasco!

Mãe, por Anastácia de Gusmão

Para a Mãe Andréa Morais de Gusmão (Porto Alegre/RS)

Parabéns por esse dia especial
quando se comemora todas as
mulheres maravilhosas,
não só aquelas que ficaram
registradas na história
mas também aquelas que estão na história
de nossas vidas.

Te dou os parabéns por ter
sido uma mulher corajosa e forte,
apesar das controversas entre nós.
Foi graças a tudo isso que sou
essa pessoa de hoje.

Parabéns por nunca ter desistido
e sempre seguir em frente
com força e determinação.

Obrigada por ajudar na minha educação
e conhecimento, e acreditar sempre em mim!
Parabéns e feliz dia das mulheres,
principalmente das Mães!

Beijos, Nana.
(Anastácia)
Lima/Peru, 2020

Preocupação de mãe, por Roselis Batistar

Filha, que dor ver-te assim cismada
Acabrunhada sobre a sorte
E seu rastro de cinza forte
Sobre a linha do horizonte.

Dói-me ver-te assim sem ti
Quando te agrides qual gorila imaginário.
Quando soluças qual vergada seringueira
Pelos ventos dos vândalos fugazes
Esquecidos do amor que tens pra dar.

Doí-me ver-te assim sem as lembranças
Das mais belas esperanças que criavas
As que tímidas criam mudas pequeninas
Cujo verde vivifica qualquer alma.

Não as vês mas estão aí
Sob esse manto que insistes em vestir
Desabrochando folhas, ramos, galhos,
Mini-pétalas em feto,
Recordando que amanhã sairá o belo sol.

França, maio de 2020

Oração pelas mães, por Bernadete Bruto

Benditas sejam
As mães do passado
Encerradas em casa
Cuidando de seus filhos
Amorosamente

Benditas também
As mães do presente
No isolamento
Se desdobrando
Entre o trabalho e filhos
Fervorosamente

Muito mais benditas sejam
Aquelas mães de todos os tempos
Sempre na rua
Trabalhando nas casas alheias
Arriscando-se pelo pão de seus filhos
Zelosamente
Cuidando dos outros.outros.

Que todo o bem do mundo

Recaia sobre elas.

Recife, 7 de maio de 2020

Por Eloisa Moraes

Fernanda, minha mãe, é a segunda filha de 12 irmãos. Carmelita, minha vó materna, uma mulher lindíssima, forte, guerreira, com uns olhos azuis que jamais vi igual. Eurydice, minha vó paterna, uma figura elegantíssima de uma cultura invejável, lembro que lia em Francês… Minha personalidade foi moldada a várias mãos, com influência de muitas mães, pois recorria sempre às minhas avós, minhas tias e minha madrinha para achar as respostas para meus questionamentos de mulher. Em todas achei o que procurava: a delicadeza, a força, a competência profissional, a solidariedade, a sexualidade, a religiosidade e a fé. Nelas encontrei enfim, o sentido da vida e tento me espelhar nos seus exemplos. O amor à minha mãe é incondicional, e consigo ver a menina sapeca que tocava o sino do colégio, a jovem popular de Olinda, a filha, irmã, tia, sobrinha, prima e amiga que todos amam.

Feliz Dia das Mães, Fernanda.

Fernanda Maria Basto Amorim de Moraes

CARINHOS COM MEL: NOSSA MÃE, por José Luiz Mélo

“Recordações da infância… As peraltices”
Recife, 16/04/2020

Não fazem alvoroço, ou metem medo
as lembranças ciscando pelo chão,
bem devagar, na ponta dos seus dedos,
com a incandescência de um vulcão.

E não esquecem o alvor dos seus folguedos
à beira mar, na praia, no verão,
as sombras piedosas do arvoredo,
que se espalham nos céus, se dando as mãos.

Recordações da infância… As peraltices
de pequenos, as nossas meninices,
minhas e de Geraldo, das irmãs:

de Matilde, de Lúcia, Luisinha,
─ arengas, algazarra na cozinha,
os carinhos com mel, de nossa mãe.

Família, Tarsila do Amaral, 1925. Gentilmente cedido do arquivo digital da Poeta Virgínia Leal.

 

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10 respostas

  1. Fantástico!!! Salete sempre nos surpreende com sua criatividade. Parabéns pela homenagem às Mães e ainda a sua família de Mulheres.
    Maravilhaaaa o texto histórico de Suzana, os de: Bernadete, Taciana, Genir, Eloisa, José Luiz, Roselis que enviou o texto lá da França onde está confinada e de minha primeira neta que tem, com muito orgulho, o nome da Vó, Anastácia. Enviou seu texto do Peru onde reside prestando uma homenagem a Mãe, Andréa que mora em Porto Alegre.
    Na realidade, presto homenagem a 5 gerações de Mulheres: minha mãe, Anastácia, eu, Andréa e Katarina, filhas e minha neta que herdou o nome da Bisavó a quem chamamos carinhosamente de Nana!!!! Para todas as Mulheres, mães, as futuras mamães o meu profundo respeito, admiração. Com afeto. Ivanildescritora

  2. Parabéns Salete, pela sua iniciativa. Adorei ter participado. Viva Salete! Viva a Cultura Nordestina!

  3. Papai,assim começou a escrever um de seus poemas como.uma homenagem às mulheres, e talvez também ás Mães. ” Mulher, anjo do Lar,/, DEUSA da Vida/, eu bendigo teu nome companheira/,do homem no.escarcéus da Vida/!

    1. Eloísa minha sobrinha engenheira com um coração de ouro. Além de possuir um jeito especial de descrever as pessoas e de escrever a vida. Da. Carmelita sua avó materna e Da. Eurydice paterna , estão fidelissimas. E.minha querida cunhada sua mãe, Fernanda, desponta tal e qual nós conhecemos.. Isso revelou em Eloisa uma vertente que nem todos conhecem: sensibilidade escondida na meiguice.

  4. Eloisa minha irmã querida, tens o dom da palavra, tudo que disseste das mulheres de nossa família e de nossa Mãe é muito verdadeiro e singular, você herdou características marcantes dessas mulheres maravilhosas que poderia citar aqui várias, mas uma delas não posso deixar de falar que é a vontade de ajudar o semelhante. E quero tambem deixar registrado o amor infinito que sinto pela nossa Mãe e dizer o quanto ela é importante para nós. Feliz dia das Mães minha querida Mãe Fernanda.

  5. Gratidão Salete Rego Barros por você me dá a honrra de publicar no blog da Cultura Nordestina Letras e Artes. Foi com imenso prazer que escrevi para este importante veículo de comunicação. Você é uma extraordinária mulher e uma excelente liderança do mundo do empreendorismo social. Amo ter você no meu ciclo de amigos. Viva a guerreira que há em cada uma de nós. Parabéns a todos e todas pelo Dia das Mães e Pães!!!!

    1. Querida Ivanilde Morais de Guamão
      Fiquei impactada pelas suas linhas onde escreve que define o dia da sua morte e termina citando que amanhã estará junto com sua mãe.Espero que leia logo meu apelo para que continues viva pois és muito importante para muitas pessoas,com seu carinho e sua escrita.Te amamos muito!

  6. Acabei de ler, lindas as homenagens às mães formando um sentido da linha de união entre gerações, um fio invisível que nos perpassa uma a uma. Adorei a alegoria e, ao mesmo tempo, senti a felicidade de fazer parte, no meu pequeno mundo, desses laços de amor.

  7. Querida Ivanilde Morais de Guamão
    Fiquei impactada pelas suas linhas onde escreve que define o dia da sua morte e termina citando que amanhã estará junto com sua mãe.Espero que leia logo meu apelo para que continues viva pois és muito importante para muitas pessoas,com seu carinho e sua escrita.Te amamos muito!

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