Saciando a fome de conhecimento
Em comunidades periféricas, uma série de desafios e necessidades é enfrentada, rotineiramente, e as ocorrências negativas, causadas por motivos diversos, ficam mais evidentes do que as positivas. Geralmente discriminados pela cor da pele, os moradores dessas localidades têm o seu caráter colocado em dúvida antes mesmo que qualquer fato possa vir a comprovar o contrário. Neste contexto de carências e dificuldades, cada um luta pela sobrevivência buscando uma melhor qualidade de vida para si e os seus familiares.
Após 90 anos do surgimento da comunidade Caranguejo Tabaiares, localizada na Zona Oeste do Recife entre os bairros de Afogados, Joana Bezerra e Ilha do Retiro, há 18 anos foi plantada uma semente de esperança para que, no futuro, pudessem ser colhidos bons frutos: uma Biblioteca comunitária, primeiro equipamento que surge como oportunidade de transformação e melhoria nas relações afetivas e efetivas dos moradores, através dos livros.
É sabido que, numa sociedade de classes como a que vivemos, o acesso ao conhecimento não é um direito garantido a todas as pessoas. Formadas em sua maioria por negros, que não tiveram acesso à educação formal, as comunidades mesmo assim cultivam a esperança num mundo mais justo e humano para os seus filhos e netos, demonstrando resiliência às adversidades.
Muitos frequentadores, em sua maioria crianças e jovens que sonham em chegar à universidade, preferem buscar o conhecimento no anonimato, deixando de fazer o devido cadastramento na Biblioteca. Por terem que priorizar o trabalho para ajudar a família a sobreviver, o objetivo de fazer um curso superior quase sempre é deixado para trás, o que vem a confirmar o alto índice de evasão escolar nas periferias dos grandes centros urbanos. Na comunidade Caranguejo Tabaiares existe um diferencial, que é o acesso aos livros de Literatura, História, Filosofia, Geografia e Artes, garantido à população, graças ao empenho de um grupo de moradores com mais condições de implementar um projeto de desenvolvimento cultural, a partir da leitura e reflexão, visando também o desenvolvimento da escrita.
O projeto de implantação das bibliotecas em comunidades periféricas enfrenta um grande desafio, que é a ausência do hábito da leitura e da escrita entre os seus moradores. Este espaço de convivência com os livros vem se mostrando favorável ao acesso à produção intelectual de grandes autores. Com eles é possível viajar sem sair do lugar, estimular a criatividade, interagir com outras culturas, desenvolver a empatia e o espírito crítico tão necessário ao desenvolvimento de uma leitura correta de mundo.
É possível afirmar que, entre os frutos colhidos nesses anos de atividades da Biblioteca Comunitária Caranguejo Tabaiares, está o despertar do gosto pela leitura e o hábito saudável que passou a fazer parte do cotidiano dos moradores. Dessa forma, a fome de nove décadas está sendo saciada pelos sabores e saberes contidos nos livros. E o conhecimento adquirido será transmitido de geração em geração na construção do novo tempo, onde a dor e a miséria ficarão no passado como ensinamento para que não venham a se repetir no futuro.
Reginaldo Pereira
Morador da Comunidade Caranguejo Tabaiares, filho de Cícero e Cícera; tem quatro irmãos e três irmãs. É casado com Adilene e é pai de Lívia Maria. Sua formação é em Administração. É Educador Social e coordenador da Biblioteca Comunitária Caranguejo Tabaiares.
Respostas de 5
“A educação muda as pessoas e as pessoas transformam o mundo ” (Paulo Freire)
Parabéns a todos que se empenham em ofertar cultura e educação aos que têm tão poucas oportunidades!
Vida longa à biblioteca da comunidade Caranguejo -Tabaiares
com certeza a biblioteca é essencial para nossa comunidade…. ela traz cultura, fome de fantasia, criatividade as nossas crianças encontram nós livros da nossa biblioteca.
Que belo texto, parabéns por colocar a voz da periferia nessa coletânea.
muito boa a publicação o grito dos Excluídos também abordou os vários tipos de fome.
Trabalho incrivelmente transformador para essa comunidade.
Essas crianças precisam dessa biblioteca.
Parabéns.