DESTAQUE LITERÁRIO DA CULTURA NORDESTINA – Elba Lins (outubro/2020)
Setembro, 2020
Tímida, ela vem em minha direção. É uma noite de julho de 2011, ao final do último espetáculo teatral As joaninhas não mentem. Traz consigo o livro de mesmo nome para eu autografar.
Alguns dias se passam. Abro a caixa de entrada e encontro um e-mail de Elba Lins sobre o impacto que a leitura do meu segundo livro lhe causara. Naquele instante epifânico, nasce o nosso diálogo.
Hoje só desejo estar neste pequeno quarto e amanhã despertar, com o sol batendo na minha janela.
Hoje não preciso de amigos, não quero amantes, quero acordar bem cedo e lavar minhas mágoas, minha face e minha alma; colocar meu chapéu de palha e sair ao sol.
Vou percorrer campos de girassóis e firmar na minha retina as cores do mundo para poder transpô-las para as telas de linho dispostas na minha varanda, à espera da luz das cores adormecidas no branco inerte das telas. Nelas vou colocar a beleza dos campos, os detalhes de todas as coisas e a dança luminosa que só eu percebo nelas.
Mesmo que me isole do mundo e me torne um louco na visão dos outros, ainda assim, surpreenderei a todos com a beleza da minha obra.[3]
Elba lê todos os meus livros e me transmite paz. Não a paz dos cemitérios, mas aquela plena de vida, e luz, e cores, e arte, reverberando em todas as células, em todos os cantos do ser.
Queria voar como estes pássaros que esperam minha morte.
Queria fluir livre no céu azul
Encontrar minha tribo perdida
Minha paz
Mas meu sangue flui para esta terra seca
E estes pássaros não me deixam voar
Preciso lutar!
Preciso fugir!
Preciso viver![4]
O barro do poema, da prosa ficcional ou teórica já existiam em Elba Lins, guardados em um oráculo precioso, bastando apenas o afeto, as leituras dos clássicos, o dar-se as mãos em dança circular de amigas para se criar confiança, dar os primeiros passos – os mais difíceis – e deixar-se queimar no fogo primevo da criação, feito uma fênix desmesurada.
Fogo primevo!
Que queima, me molda
E funde o barro amorfo.
Fogo criador,
Que me transforma
Em ser vivente.
Fogo selvagem!
Que me levou um dia
Pelas asas da paixão…
Que me inflou por dentro
E me fez
Brasa que queima.
Fogo lento!
A aquecer
Meus dias,
Minhas noites,
Doces e serenas.
Fogo, companheiro do fim
Que queima o que criou…
O que ontem foi meu corpo ardente
E hoje frio e sem vida
Arde contigo
No nosso encontro final.[5]
Elba percorre os caminhos tortuosos da escrita, tantas vezes difíceis de se trilhar. Mas ela não se encontra só. Ela reconhece companheiros e companheiras de mesma dor, mesma luz, mesma busca de sentido que a verdadeira arte nos dá.
Oh lume!
Oh luz sagrada!
Alumia o meu caminho
Já percorri estradas
Já escalei montanhas
Sem nada encontrar
Cheguei a rios
Mas tive medo de mergulhar
Dancei cirandas fados e tangos
Me perdi nos passos
Do eterno buscar
Fiz poemas
Escrevi dor
Fugi por ruas escuras
Com alma em brasa a me perturbar
Falei línguas, teci histórias
Deixei de falar
Me escondi de mim
Garimpei pelos caminhos
Pelos atalhos, rios, riachos
Buscando pedras preciosas e gema brilhante
Não pude alcançar
Parei de correr
Parei de andar
Olhei para dentro de mim
E encontrei a semente
Da flor de criar[6]
E, com a estatura de mulher inteira, escritora plena, aroma de primavera desabrochando no verão nordestino brasileiro, entre borboletas e girassóis, Elba Lins encontra-se pronta para voar, para lançar palavras ao vento, papel e tinta, amiga de Ariana, a Rainha do Amor Perfeito dos próprios versos, contos e reflexões.
Borboletas
Luz pálida
Orvalho
Grama verde
Sorriso
Corais
Madrepérola
Tuas mãos
Flor de algodão
Beija-flor
Cor lilás
Nuvem de pó
Flauta doce
Amanhecer
Abelha
Pérolas
Cristal
Raio de luz
Tua pele
Arrepio
Arco-íris
Cetim
Papel em branco
Girassol[7]
[1] Elba Santa Cruz Lins (Monteiro/PB, 1957) é formada em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal de Pernambuco (1979), com MBA em Gestão de Negócios (EAD) pela PUC-PR. Trabalhou durante 34 anos na área de Telecomunicações da CHESF (Companhia Hidroelétrica do São Francisco). Atualmente aposentada, dedica-se à escrita. Fez curso de Contação de Histórias no Zumbaiar (Recife). Faz poesias, há cinco anos participa dos Estudos em Escrita Criativa, sob a coordenação de Patricia Gonçalves Tenório, e cursou a primeira turma da Especialização Lato Sensu em Escrita Criativa – Unicap/PUCRS (2019.2/2020.2). Lançou em 2017 seu primeiro livro de poemas, Do outro lado do espelho: O feminino em estado de poesia. Participou com textos teóricos da trilogia Sobre a escrita criativa (2017, 2018, 2020). Destaque Literário (projeto de Bernadete Bruto) da Cultura Nordestina (Salete do Rêgo Barros) no mês de outubro, 2020. Contato: elbalins@gmail.com
[2] Escritora, dezessete livros publicados, sendo um deles em formato vídeo-podcast, mestre em Teoria da Literatura (UFPE) e doutora em Escrita Criativa (PUCRS). Contatos: grupodeestudos.escritacriativa@gmail.com e https://www.youtube.com/estudosemescritacriativa
[3] Elba Lins, 06/09/2016, “A luz das cores”. Texto escrito a partir da observação de um postal, exercício do grupo de Estudos em Escrita Criativa, composto por Bernadete Bruto, Elba Lins e Patricia Gonçalves Tenório.
[4] Elba Lins, 19/08/2017, 12h31, a partir da capa de Chão arejado, de Marcos Torres, Interpretações gráficas de Uilian Novaes, Guaratinguetá, SP: Penalux, 2017, no encontro de agosto, 2017, do grupo de Estudos em Escrita Criativa, composto por Bernadete Bruto, Elba Lins, Luisa Bérard, Patricia Gonçalves Tenório e Talita Bruto.
[5] Elba Lins, “Fogo – Do Barro à Pira, Companheiro de Vida”, 20/08/2017. Poema escrito no último encontro dos Estudos em Escrita Criativa 2018, aberto ao público na Livraria Cultura do Shopping RioMar, Recife, em 10/11/2018.
[6] Elba Lins, “Buscando o sentido da vida”, 06/04/2019. Poema escrito na aula sobre o Brasil do curso de extensão Estudos em Escrita Criativa na Unicap.
[7] Elba Lins, “Leveza”, 01/08/2020. Exercício de desbloqueio em quinze minutos do módulo sobre o Japão dos Estudos em Escrita Criativa On-line. Elba utiliza uma de suas técnicas favoritas: as listas de Sei Shônagon.
Respostas de 3
Elba é assim, leitora voraz, escritora fluida, límpida e frenética. E em tudo que faz, imprime amplo sorriso e a doçura que a caracteriza. Elba e Patricia, linda história desses encontros que só quem nos dá é a vida. Feliz que Elba esteja pronta para permitir que o mundo acompanhe e admire a trajetória de seu voo artístico-literário e se inebrie em suas palavras. Nós merecemos, e precisamos, desse regalo.
Elba sempre tímida, mas uma observadora fiel. Em toda sua trajetória de vida foi sempre muito cartesiana. A poesia a fez mais irreverente e com isso a criatividade jorrou do seu interior. Parabéns menina mulher artista e amiga ❤️
Obrigada Patrícia por suas palavras. Ter encontrado vocês no meu caminho literário só me trouxe bons frutos. Muita poesia floresceu nestes 4 anos de grupo de estudo com você sempre nos motivando e repassando conhecimentos teóricos. Gratidão imensa!