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AGROECOLOGIA: agricultura sustentável e mudanças climáticas, por Rivaldo Mafra

Em tempos de mudanças climáticas e pandemias, a proposta da Agroecologia para uma agricultura sustentável ressurge forte. Mas, do que trata a Agroecologia? A agricultura, desde o período Neolítico, há cerca de 10 mil anos, e até os dias atuais, tem sido atividade de perturbação dos ecossistemas. Numa situação de mudanças climáticas, os impactos dos atuais sistemas de exploração agrícola contribuem para o agravamento da crise ambiental das sociedades contemporâneas.

Desde a década de 1890, no entanto, alguns pesquisadores alertam para o risco destrutivo da concepção e propósitos da agricultura “industrializada”. Surge outra forma de pensar. A espécie humana é vista como um dos componentes da teia da vida na Terra. Diferencia, pois, dos demais organismos por ser um consumidor singular. Portanto, seus sistemas agrícolas, vegetais e animais, devem estar em harmonização com os ecossistemas. Em outras palavras, as populações de plantas ou animais e as demais entradas promovidas pelo ser humano na atividade agrícola devem estabelecer relações harmoniosas com os organismos e processos físicos, químicos e biológicos fundamentais de cada ecossistema.

A Agroecologia, dentro de abordagem puramente teórica, é entendida como estudo de fenômenos puramente ecológicos que ocorrem nos campos cultivados tais como: fluxos de energia, ciclo de nutrientes e de matéria orgânica e coações entre organismos. Para alguns pesquisadores, entretanto, o termo Agroecologia tem conotação mais ampla.

Segundo HECHT (1989), “a Agroecologia incorpora ideias mais ambientais e sentimento social acerca da agricultura”. ALTIERE (1989) ao tratar da Agroecologia, diz: “na agricultura, as transformações energéticas, os ciclos de nutrientes, os processos biológicos e as relações socioeconômicas devem ser considerados como um todo”.

Na Agroecologia, portanto, são poucas as verdades universais. Cada ambiente físico e seus sistemas biológicos associados têm uma história diferente. Apoia essa concepção da Agroecologia, uma visão coevolutiva do mundo proposta por Norgaard (In: ALTIERE/2002). Sob esse prisma, climas, solos e seus sistemas biológicos – ecossistemas diferentes – conduzem às diversas formas de organização social, possibilitam diferentes conhecimentos, encorajam diferentes valores e suportam diferentes tecnologias (Figura 01).

Figura 01. Representação esquemática da coevolução do conhecimento, dos valores, da organização social, do ambiente físico e seus sistemas biológicos e da tecnologia (Norgaard in ALTIERE…2002).

As atividades do ser humano na natureza, em busca da satisfação de suas necessidades, conduziram à criação de formas, de valores, de atitudes, de organização social, de conhecimento e de tecnologia, inerentes às características de cada ecossistema. Desse modo, é possível utilizar essa ferramenta teórica para entender os efeitos históricos da ocupação do espaço e uso dos recursos naturais dos principais ecossistemas brasileiros – Amazônia, Cerrados, Mata Atlântica, Pantanal e Caatinga – sobre formas, costumes e valores culturais de seus habitantes.

O instrumental teórico da Ecologia Humana também estabelece uma visão coevolutiva do mundo. Para essa Disciplina, a espécie humana, um dos componentes do reino animal do sistema ecológico, participa como consumidor singular da cadeia alimentar. Ocupando determinado espaço na biosfera, ele age de forma ímpar – o Trabalho – sobre a natureza em busca de construção do seu habitat. Nessa ação, cada vez mais crescente, do domínio e exploração da natureza, ele estabelece certos tipos de relações sociais. Entre elas estão as denominadas relações sociais de produção. Para MARIA JOSÉ DE ARAUJO LIMA, “a interação homem – natureza se concretiza por duas vias”. Uma delas, através da transferência de energia, inerente às relações biológicas. A outra, por meio da realização do trabalho, estabelece as relações sociais. Estas formas de relações, resultantes da interação homem – natureza, conduzem à transformação da espécie biológica (Homo sapiens) em ser humano” (Figura 02).

Figura 02. Esquema do processo de transformação da espécie biológica (Homo sapiens) em ser humano (MARIA JOSÉ DE ARAUJO LIMA).

As explorações vegetal e animal, sob a ótica das ferramentas teóricas da Agroecologia e da Ecologia Humana, podem ser vistas como resultantes da ação humana sobre os ecossistemas. Seriam, portanto, Agroecossistemas. Isto é, ecossistemas transformados. Neles ocorrem tantos processos ecológicos (fluxo de energia, ciclos biogeoquímicos e coações entre organismos dos tipos – predador/presa, competição, comensalismo e sucessão) quantos processos socioeconômicos.

Assim, o ser humano ao abandonar o papel de interventor e dominador da natureza, ver-se-á apenas como um consumidor “singular” da cadeia alimentar de todos seres vivos do ecossistema que habita. Isso fará da Agroecologia o modelo a ser usado no enfrentamento das mudanças climáticas, e na sustentabilidade ambiental e socioeconômica da Agricultura.

 

LITERATURA CONSULTADA

ALTIERE, M. A. Agroecologia: as bases científicas da agricultura alternativa / Miguel A. Altiere; tradução de Patrícia Vaz. Rio de Janeiro: PTA/FASE, 1989.

ALTIERE, M. Agroecologia: as bases científicas para uma agricultura sustentável. Guaíba : Agropecuária, 2002, p 53 – 55.

HECHT, J. B.   A evolução do pensamento agroecológico. In: Agroecologia: as bases científicas da agricultura alternativa. Rio de Janeiro: FASE/PTA. 1989. p. 25-41.

LIMA, M. J. de A. Ecologia humana: realidade e pesquisa. 2. Ed. Recife: Imprensa da UFRPE, 1965. 164p.

 


Rivaldo Mafra

Rivaldo Chagas Mafra (Olinda, 06/10/1933). Engenheiro agrônomo pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE, 1962), professor aposentado e ex-coordenador do Curso de Agronomia da UFRPE. Professor do Curso de Especialização por Tutoria a Distância em Agricultura Tropical dos cursos – Agroecossistemas e Tecnologias Para Agropecuária do Semiárido Nordestino (ABEAS, 1988/2001). Pesquisador aposentado do Instituto de Agronômico de Pernambuco (IPA, 1963-1998) e Diretor Técnico da Empresa Pernambucana de Pesquisa Agropecuária – IPA (1979/1980). Viagens de estudos em Colômbia, México, Costa Rica, USA, França, Senegal, Mali, Índia e Moçambique (1979/1983). Consultor na área de projetos agrícolas, com destaque para: planejamento Agrícola do Projeto Borda do Lago de Itaparica (Pernambuco, 1986/1987) e assistência técnica aos agricultores familiares do Projeto de Irrigação Manga de Baixo (Belém do São Francisco/Pernambuco, 1986/87). Coordenador do Projeto de Difusão de Tecnologias e Assistência Técnica aos Agricultores do Assentamento Porteiras (Pombos/Pernambuco – 1995/97) e Assentamento do Engenho Ubu (Goiana/PE- 1997) e do Projeto de Difusão Tecnológica em Apoio a Pequena Agricultura Irrigada para os agricultores familiares da Associação dos Moradores e Produtores Agropecuários de Sapucarana – Bezerros/PE, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Brejo da Madre de Deus/PE e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jataúba/PE (2006 – 2008). Mais de 100 trabalhos técnico-científicos publicados. Membro das Academias Pernambucana e Brasileira de Ciência Agronômica.

 

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Uma resposta

  1. Trabalho realizado com fundamentação científica.Abordagem generalizada.Senti falta de uma visão crítica sobre a ação destrutiva dos homens sobre os ecossistemas

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