A criança interior, por Lívia França

Lívia Ferreira de França é criança há 39 anos, uma recifense que abraça árvores e ama as flores e os animais. Graduada em arquitetura e urbanismo e mestra em desenvolvimento urbano pela UFPE, é arquiteta do IFPE e desenvolve pesquisa de doutorado na Universitéde Toulouse, França. E é casada com Péricles e mãe de Melissa, Luís Eduardo e Pietro.

A criança interior

Ela está sempre lá

tagarela, espevitada

ou recolhida, perdida em recordações

faz um tempo decidimos olhá-la

ah! Era só o que faltava

era isso mesmo que ela esperava

ela sempre esteve lá

era a gente que não via

não ouvia e não sabia

agora é diferente

tem um monte de gente querendo dela tratar

uma criança machucada, machuca outras crianças

a criança ferida, se curando, aprende também a curar

calma… abraça. Daqui por diante tudo vai mudar

há, sim, tempo para olhar, para sentir, para tolerar

pois foram tantos os momentos

em que ela teve que escutar

“você é linda, fada, braba, preguiçosa

inteligente, caprichosa, um anjo

tem mau gênio, é debochada

desenha como ninguém

dança muito desengonçada

fez bobeira, tem que apanhar

não há lição no erro, você não pode errar!”

caem rótulos por cima de rótulos

lá dentro ela ainda está

nua e assustada, aliviada também

nada mais a esconder

tempo é chegado de acolher

a gente acaba de morrer quando acorda

disse um velhinho de quatro anos

quem foi que disse que seria fácil?

há ainda que decidir

como seguir na caminhada

ora, vamos de mão dadas!

onde já tem luz, faz-se mais então

clareia um monte de escuridão

eita! Como ela agora ri

foi vista, foi aceita, sente-se amada

vejam só! Ela é toda gratidão

criou o incômodo só buscando aceitação

liberada, se despede:

“deu certo, posso partir! De vez em quando eu volto

fica bem e vê se aprende a sorrir!”